quarta-feira, 31 de janeiro de 2018

Nas Séries: The Crown - Segunda Temporada


Essa é a primeira vez que me proponho a escrever algo sobre a temporada inteira de uma série. Enquanto pensava sobre o que escreveria, descobri que essa não é uma tarefa fácil. Em primeiro lugar, porque são muitos episódios, nesse caso, são dez, e cada um deles despertou sentimentos próprios em mim, há episódios mais emocionantes e impactantes, e outros que não são tão bons assim. É difícil uma série que consiga manter o nível em todos os episódios da temporada, sempre há aquele patinho feio, e isso aumenta ainda mais a dificuldade de falar da temporada como um todo. Em segundo lugar, há o tempo que levei para assistir toda a temporada. Os primeiros episódios, aqueles que vi há algumas semanas, já estão meio desbotados na minha memória e, talvez, eu não lhes atribua a devida importância. Com essas considerações feitas, vamos falar especificamente da segunda temporada de The Crown.


The Crown é uma série sobre a monarquia inglesa, mais especificamente sobre o reinado da rainha Elizabeth II. A primeira temporada trata dos primeiros anos do reinado e dos conflitos vividos por Elizabeth ao tentar conciliar seu papel de rainha e o papel em sua família. Na segunda temporada, acompanhamos os anos do reinado a partir de 1956, no ponto em que termina a primeira temporada. Já nos primeiros episódios da segunda temporada, a crise do casamento real se intensifica. Os problemas já apareciam durante a primeira temporada, mas, dessa vez, eles tomam proporções ainda maiores, inicialmente por causa de uma longa viagem (uma viagem de 5 meses!) que Philip faz, a pedido da própria rainha, para visitar países do commonwealth. Embora Elizabeth aparente estar mais confortável em seu cargo de rainha, ela ainda não consegue tratar dos conflitos com Philip e, assim, as questões pendentes entre os dois vão se acumulando. A cada episódio, o casamento real se deteriora um pouco mais e a distância entre Philip e Elizabeth aumenta gradualmente.


Enquanto Elizabeth não consegue lidar de maneira satisfatória com os problemas de seu casamento, que são causados, sobretudo, pelo comportamento questionável e o descontentamento de Philip com a vida na realeza e com o próprio casamento, ela parece estar mais à vontade em seu papel como rainha. Na primeira temporada, Lilibeth era uma estranha perdida nos meandros da monarquia e da política. Agora, ela parece atuar com mais consciência e agir segundo suas próprias vontades, embora a postura da rainha, em alguns momentos, continue um pouco engessada. Nessa segunda parte da série, vemos uma rainha que toma  decisões, ao contrário da rainha quase completamente neutra e amena dos primeiros anos de seu reinado. Além de demonstrar um pouco mais de atitude, Elizabeth acerta em muitas dessas decisões e mesmo quando ela parece estar equivocada ou quando suas ações parecem imprudentes, surge algum motivo, algum elemento que justifique essas atitudes.


Os personagens secundários também são importantes na segunda temporada e os episódios dedicados a eles, talvez, sejam os melhores. Em primeiro lugar, gostaria de citar os episódios que tratam diretamente de Margaret (episódios 4 e 7). Depois do conturbado e mal sucedido relacionamento com Peter Townsend, ela se entrega de vez a uma vida boêmia, aos cigarros e à bebida. Em uma dessas aventuras, depois que Townsend comunica-lhe que vai se casar com outra, ela conhece Tony Armstrong-Jones e a relação deles acaba por render um dos episódios mais interessantes da temporada. Em segundo lugar, gostaria de destacar o episódio em que um jornalista (Lorde Altrincham) tenta provocar uma renovação na estrutura e na postura antiquada da monarquia publicando duras críticas diretamente  às atitudes e habilidades de liderança da rainha (episódio 5). Esse episódio é importante porque aborda questões que implicaram em uma espécie de transformação do comportamento da rainha e da relação entre a realeza e o povo. Em terceiro lugar, há o episódio que trata da visita que os Kennedys fizeram à rainha (episódio 8). Estava ansioso por esse episódio, pois havia visto uma notícia em algum site que anunciou que JFK e Jackie apareceriam. Não me decepcionei. É um episódio intrigante, em que mais um vez a capacidade de Elizabeth em ocupar um cargo tão importante é questionada pelos outros e por si mesma. Por fim, o episódio em que é descoberto um informante nazista no alto escalão do governo britânico (episódio 8). Esse episódio me deixou bastante surpreso e me fez entender o comportamento que alguns personagens tinham desde a primeira temporada. Depois desse episódio, cheguei à conclusão de que a rainha é sempre a última a saber das coisas.


A temporada se encerra com o derradeiro conflito entre Elizabeth e Philip. Tudo se desencadeia a partir de um escândalo que afeta o governo gravemente, mas que, na verdade, poderia ter sido muito pior, se a verdade não tivesse sido abafada pelos assessores da realeza. Essa situação faz com que o casamento real chegue ao seu limite e não seja mais possível fingir que tudo continua bem. Elizabeth está saturada, está se afogando nas muitas vezes que teve que engolir as canalhices descaradas de Philip (desabafei!). O confronto acontece e Elizabeth precisa mais uma vez fazer concessões em prol de suas obrigações e limitações reais. Esse episódio me fez pensar que a rainha não é mais do que uma súdita do sistema real, uma súdita de suas obrigações, uma súdita da aparência.


Depois de assistir a toda a temporada, vemos que ela possui uma alta carga de episódios que se sustentam em questões políticas (como o conflito com o Egito pelo domínio do canal de Suez ou o impasse com Gana). No entanto, em contrapartida, temos episódios mais pessoais que desenvolvem as tramas de personagens específicos, como Margaret, Philip e Charles. Além disso, é possível perceber a ampliação da dualidade da postura da rainha. Há muitos momentos em que percebemos uma postura mais humana da rainha, em que ela abandona um pouco a languidez e demonstra seus sentimentos, sua raiva, sua felicidade. Entretanto, a rigidez e a impessoalidade da líder real continua lá, como em um jogo em que temos uma rainha humana e outra neutra e intocável, ora uma está no controle, mas logo depois a outra toma frente. Percebemos também que os episódios estão um pouco menos interligados, como se contassem recortes do cotidiano dos personagens. Isso fez com que a temporada abordasse vários temas e questões polêmicas, o que me deixou bastante empolgado, pois era um escândalo impactante depois do outro, mas também comprometeu um pouco a unidade da temporada e a fluidez da sequência de episódios.


Por fim, digo que essa temporada é incrível e acho que, como um todo, me impressionou mais do que a temporada anterior. Considero os episódios mais impactantes e as histórias contadas mais dinâmicas em relação as da primeira temporada. Um ponto que é bastante perceptível é o cuidado em preservar a imagem das personalidades retratadas na série, sobretudo da rainha, o que se contrapõem às tentativas de humanizar a realeza e isso, talvez, possa soar um pouco estranho, já que um dos objetivos da série é popularizar a família real. As atuações continuam impecáveis, os cenários são luxuosos e belíssimos e meu interesse por conhecer a história da realeza britânica da forma como The Crown se propõe a contar só aumenta. Resta dizer que a segunda temporada de The Crown é imperdível e que cada episódio deve ser apreciado com a calma e sutileza que merece, pois são apenas 10 episódios e, quando eles acabam, sentimos uma falta tremenda da nossa Lilibeth.






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